A época Natalícia por mim já foi vivida de diferentes formas tal como a lua tem diferentes fases. Um dia a ingenuidade viveu em mim tal como o silêncio. Vivia como qualquer criança mas a minha história não era similar aos outros sorrisos inocentes e felizes.
Era vez uma menina que tinha o seu mundo de conto de fadas, com uma colossal colecção de brinquedos e que vivia numa vivenda que se assimilava a um palácio. Era uma princesa. Vivia num castelo. Mas não havia amor.
Ainda assim... essa menina acreditava na boa vontade das pessoas, idealizava os momentos e não se preocupava com presentes. Gostava de receber mas aceitava o que lhe ofereciam com um sorriso do tamanho do Universo. Sempre que chegava o dia oito de Dezembro, sua alma preenchia-se de harmonia, do espírito natalício.. Agarravq na mão de seu irmão e levava-o até à dispensa que ficara debaixo das escadas que davam acesso a garrafeira do pai e ao baú das recordações da mãe. Nessa espécie de pátio, havia duas portas de madeira pequenas tal como o seu tamanho, fazia lembrar a casinha das bonecas. Ela entrava delicamente para que não pisara nenhum artefacto natalício..e começa a procurar naquela arrecadação repleta de tralha e de sacos e saquinhos os efeitos para colocar na árvore. Ia tirando um a um ... ficara um mar de decorações natalícias sob o chão brilhante de xadrez.
Era tempo de abrir os raminhos da árvore artificial que se juntavam pelo tempo que estava guardada. Era uma bolinha aqui, outra acolá, luzinhas cintilantes, fitinhas diversas .. e não podia faltar o cenário essencial, o presépio. Estava já preparada para o tão desejado momento do ano. Ela ansiava mais o Natal do que o seu próprio aniversário ou mesmo dia da criança. Os presentes eram uma espécie de jogo-labirinto para aqueles irmãos. Movidos pela curiosidade juvenil , acabavam por encontrar-los sempre. Contudo, mesmo não sendo surpresa.. olhavam para o relógio.. no seu imaginário os ponteiros pareciam estar parados, congelados pelo frio.. sentados sob o sofá verde de padrões amareladas, contavam os minutos.. atentos ao queimar da lenha..Queriam que chega-se a 00h 00m. Seu pai tocara músicas natalícias intercaladas com um sublime fado para satisfazer todas as idades..tocava-se o tão famoso instrumento alentejano desta época, a ronca.. cantava-se ao menino.. a mesa estava repleta de iguarias.. nada faltava! Ou quiçá não. (Talvez essa menina aprendera a viver precocemente à sua maneira e ver o mundo de uma maneira mais simples e não tão consumista e de forma fútil)..
O tempo passou. E essas memórias são as últimas que essa menina se lembra. Compraziava-se com o mais simples bonequinho.. só o gesto já era um presente. Desde muito cedo, ela aprendeu que o mais importante na vida ...é tudo aquilo que não se vê, que não está embrulhado em papel colorido e laços colossais. Não lhe importava mais que nessa noite já não houvesse uma caixinha com o seu nome debaixo da árvore de Natal. Tudo o que ela mais queria era o que nunca teve. Nunca o terá. Uma família reunida, companheira e leal. Ela era consciente que todos os adultos tinham problemas, nunca lhe fizera mais que ninguém, ainda assim, sabia que havia algo de errático do que os outros meninos do seu infantário.
Durante alguns anos depois dos seus pais se separarem , ela tentou criar o seu próprio espírito natalício. Continuava a fazer a tão deliberada árvore de natal.. colocava cada efeito de forma pensada.. quiçá, ela pensara que na sombra das bolas decorativas se pudesse ver o reflexo de um sorriso que esta época tanto pede e acaba por exigir de nós, mais que não seja pela sociedade.
Aquela menina juntavam cada moedinha que lhe davam ao longo do ano e colocava no seu mealheiro da barbie, selado com um cadeado e guardava a chave sempre consigo. Evitava comprar aqueles sacos repletos de guloseimas que a infância saboreava tanto. Tudo o que ela mais queria era retribuir de uma forma simpática aquilo que sentia pelasas pessoas que recebiam os seus presentes , que eram o reflexo de uma atitude não de consumismo mas sim de carinho, era um simples gesto que ela tinha. Ela adorava retribuir o amor que lhe davam. Coloria postais com desenhos natalícios feitos por si mesma juntamente com dedicatória especial para cada pessoa. Amara escrever e sempre foi evidente que se expressara melhor por palavras de papel do que pela projectação da sua voz que era engolida pelo medo e silêncio.
Dia um de Dezembro significava para ela nada mais que uma pura adrenalina, uma azáfama constante.. Criava listas dos presentes que mais se enquadravam em casa pessoa do seu coração. Conseguia-a fazê-lo notoriamente. Na noite do nascimento do menino Jesus, arrancava um sorriso pelo presente e uma lágrima pela dedicatória.
Ela queria manter aceso o espírito natalício. E acaba por conseguir, não como gostaria.. pois ela gostava que o Natal fosse todos os dias do ano... todos os dias se precisa de amor, de carinho, de um abraço e de uma palavra sincera..
Dezembro tornou-se num nada. O tempo muda e as lembranças permanecem nela. Foi neste mês de frio e distante que a vida lhe levou o seu anjo da guarda, o seu padrinho, quem a criara.. Foi o morrer de tudo. A partir de dia três de Dezembro...o mundo encantado daquela princesinha caiu como as folhas que caem quando vem o Outono..
Antes desse episódio crucial da vida dela.. o natal era uma rotina... mas que lhe agradava.. com os preparativos...as cartas de felizes festas.. tudo deliberado .. Era no dia vinte e quatro que ela ia à casinha onde crescera.. subia as escadas numa correria própria da idade e tocava à campainha.. ouvira os cães ladrar.. dava os presentinhos e virava costas.. Magoada.. por saber que essas pessoas que a criaram são mais que sua família e por ir passar esse dia especial com pessoas que por vezes agem como não fossem do próprio sangue.
Ela.. passados uns aninhos mais... voltou a ter mais desgostos... Dezembro simboliza o mês em que o seu rosto se lava em lágrimas sobretudo pela noite de natal... a ela e à sua mãe que também tem no céu a estrelinha que olha por ela, seu pai...seu avo que lhe desperta uma dor pelo facto de nunca se ter sentado no seu colo e saber o que é realmente ter esse carinho que tantos falam e se admira..
Houve anos que não passou com os de sempre derivado a males entendidos familiares.. Este ano foi mais um.. mas este ano não foi o pior.. pois para aquela menina o mais doloroso momento foi quando lhe arrancaram o seu pai de coração.. mas este ano... a sua avô preferiu fazer uma auto-agressão e nesse sentido castigou netas e filhos.. e passou com o irmão da menina, namorada e o pai da jovem. Foi um cenário que constrangedor.. mas que não a surpreenderá. Terminando com o pouco valor para ela simbolizava. Ao ver aqueles rostos irónicos.. aqueles olhares conscientes do mal que fazem aos outros com as suas atitudes.. Não me preocupo mais. Como diz a minha mãe e acertadamente: Deus é grande!
Essa menina era eu...Odeio Dezembro.. São memórias recalcadas que regressam no meu pensamento e fazem soluçar de novo o coração..
Ps: Peço desculpa por não responder ás mensagens natalícias, esse espírito já não reside em mim. Contudo, não fico indiferente e recordo-me dos tempos que não era feliz nesse dia mas que ainda tinha um sorriso. Agradeço de coração as inúmeras dedicatórias.. significa que ainda sou lembrada por alguém mesmo em dias tão sombrios e cruciais.
Dezembro tornou-se um mês de consumismo.. de filas enormes nas caixas dos supermercados.. de pratelerias repletas de brinquedos.. dos cumprimentos com desejos de boas festas..
Afinal Dezembro lá por ser o último mês do ano é o único que se pode oferecer um mimo a quem se gosta? é quando se pode fazer um gesto simbólico nas causas solidárias? É quando se lembram das pessoas e animais abandonados?É quando se lembram das injustiças deste mundo? (É todo o ano que se necessita de amor, paz, saúde, alimentação...) São Trinta e um dias de hipocrisia.
Volto a dizer..odeio este mês! Cada vez mais Dezembro é um mês que não devia constar no meu calendário.. faz-me mergulhar em recordações profundas e obriga-me ter um sorriso mascarado..Tenho uma alma intensa e atormentada.. que nutre saudades do que viveu..que adorava voltar a ser criança nem que fosse por um Natal.
Parece-me que.. a felicidade é uma sensação que me é entregue conta-gotas e me cobram um valor exorbitante por seu preço.
Só sei que vivo pelos que carrego no peito.
2 comentários:
Olha olha e escreveres mais vezes não?
beijo
Oh minha linda, independentemente de tudo aquilo que passaste tu e a tua mae, lembra-te que tens mais familia do que isso (sem ofensa). As coisas nao acontecem por acaso, e se a ti te calhou ver e sentir o que nao querias, sinto muito, mas ergue a cabeça e vê o teu futuro como um objectivo a alcançar, com muita sorte e felicidade, porque se passamos a vida a dar valor a esses acidentes, nao gozas nada dela e mais, apaga essa memoria triste que tens e dá mais valor á pessoa que és, porque infelismente, nos dias de hoje, so podemos contar connosco, o resto, só atarapalha, mas nunca deixes de parte todos aqueles que te apoiam, independentemente dos bons/maus conselhos que te dão, porque linda, essas pessoas, preocupam-se contigo e só querem a tua felicidade, mais nada.
Com grande carinho da minha parte, beijinhos muito grandes.
L&M
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